Capítulo 4 - A emigração vista como solução para as questões internas. (2)

A exploração da Amazônia.

Os pedidos de remessa de imigrantes japoneses para a Amazônia.

Entre o fim do século XIX e o ano de 1914, a Amazônia viveu uma fase de prosperidade graças à extração do látex. Em 1897, o embaixador brasileiro no Japão discutiu a possibilidade de se introduzir o imigrante japonês na Amazônia para a extração de látex durante uma conferência em Tōkyō. A Legação Japonesa no Brasil, porém, opôs forte resistência ao projeto, alegando que somente os nativos poderiam suportar o trabalho em condições tão adversas como aquelas impostas pela região equatoriana, tipicamente tórrida e úmida, na qual predomina o solo avermelhado.

Uma vez deflagrado o processo emigratório, os órgãos representativos do governo japonês sempre estiveram atentos à forma como o assunto era abordado, de modo a não se deixarem levar pelas palavras doces que acompanhavam as propostas de introdução da mão-de-obra japonesa na extração do látex.

A descida do rio Amazonas.

Nesse ínterim, alguns japoneses teriam chegado, em 1905 (1907, segundo outras fontes), à Amazônia brasileira depois de atravessar a cordilheira dos Andes, passando pelo Peru e pela Bolívia, muitos tendo vindo dedicar-se à extração do látex. Esses imigrantes eram chamados “Amazon kudari” ou “Peru kudari”, e estima-se que, até 1910, cerca de 400 ou 500 pessoas teriam chegado ao Brasil nestas condições. Alguns foram dedicar-se ao cultivo de hortaliças, enquanto outros abriam lojas em diversas partes da Amazônia.

Em 1922, o judoca Mitsuyo Maeda (o “Conde Koma”), que havia chegado ao Brasil vindo dos Estados Unidos, tendo percorrido diversos países da América Latina, fixou-se na cidade de Belém, no Pará, tendo adquirido fama como instrutor de judô na região. Tendo construído uma rede de contatos importantes no Pará ao longo dos anos, Maeda desempenharia um papel importante na expansão dos japoneses na Amazônia anos mais tarde.

As doações de terras a países estrangeiros por parte do governo estadual.

O cenário animador produzido pela extração do látex na Amazônia não durou muito — em 1876, os ingleses haviam levado para fora do Brasil algumas sementes de seringueira em sigilo, de modo que, anos mais tarde, mercados do mundo inteiro já comercializavam borracha feita a partir do látex extraído na Ásia meridional e no Sudeste Asiático. A economia local da Amazônia, que dependia, essencialmente, da extração do látex, sofrera com isso um grande golpe.

Dessa maneira, o processo de abertura nos estados do Amazonas e do Pará havia sido deflagrado por imigrantes estrangeiros; agrupando os imigrantes de acordo com seus países de origem, o governo fazia uma concessão de terras a cada grupo (para tanto, era antes necessário fazer a medição do terreno, escolher, dentre as terras que lhes foram designadas, aquela que mais lhes aprouvesse, e, por fim, traçar com exatidão as fronteiras da área escolhida, tudo isso dentro de um determinado prazo). As indústrias Ford, dos Estados Unidos, tendo assegurado uma concessão de 1,5 mi de hectares, deram início à exploração da região em 1928.

Acreditando que a causa do surgimento de movimentos contrários à imigração japonesa era a concentração dos nipônicos no estado de São Paulo e nos demais estados circunvizinhos, a embaixada japonesa propôs escolher uma nova região para que os japoneses pudessem explorar. Assim, o então embaixador, Shichita Tazuke, enviou em 1924 o secretário Ryōji Noda à Amazônia, com o intuito de obter informações sobre o local.

C.ia de Exploração da América do Sul (estado do Pará).

Hachirō Fukuhara e sua equipe de exploração.

Em 1925, o engenheiro agrônomo Yasuhei Ashizawa, que viera ao Brasil na condição de inspetor agrícola do Ministério das Relações Exteriores, juntamente com o bolsista Hideo Nakano, da Kanebō, foram enviados ao Pará portando uma carta de apresentação redigida pelo embaixador Shichita Tazuke e endereçada ao então governador do Pará, Dionísio Bentes, tão logo foram concluídas as pesquisas sobre a cultura do algodão no nordeste brasileiro. Com isso, Ashizawa ficou encumbido de transmitir ao embaixador a proposta, feita pelo governador do Pará, de concessão de 500 mil hectares para a construção de um assentamento japonês na região (devendo a escolha do lote ser feita dentro de um ano).

O governo, que fora informado a respeito das transações pelo embaixador num telegrama, confiou à Kanebō uma certa quantia em dinheiro para que as pesquisas de campo pudessem ser realizadas e um lote escolhido. As pesquisas de campo foram conduzidas pelo diretor da Kanebō, Hachirō Fukuhara, entre maio de 1926 e 1927. Durante as pesquisas, Fukuhara encontrou a região situada em redor do rio Acará, a qual considerou propícia para a realização do projeto. Em uma conferência com o governador do estado, Fukuhara recebeu oficialmente a doação de cerca de 500 mil hectares de terra e o direito de reivindicar outras três regiões que considerasse propícias no estado do Pará.

O estabelecimento da Colônia Acará.

Em 26 de março de 1928, o então primeiro-ministro e também ministro das relações exteriores, Giichi Tanaka, reuniu na residência oficial diversas figuras proeminentes do mundo dos negócios a fim de discutir o plantio de algodão e a colonização da região amazônica. Como resultado desse encontro, foi criado um comitê para a criação de uma empresa específica para esse fim. No dia 11 de agosto, utilizando-se do capital fornecido pela Kanebō (10 milhões de ienes), foi criada a C.ia de Exploração da América do Sul Ltd.a.

Hachirō Fukuhara, que havia sido escolhido para assumir a presidência da nova companhia, partiu tão logo a companhia foi fundada, chegando a Belém do Pará em outubro do mesmo ano. Em dezembro, assinou com o governo do estado um contrato em seu nome recebendo a doação das terras de Acará, Monte Alegre e outros 3 lotes espalhados pelo estado. Em janeiro de 1929, foi criada no Brasil a C.ia Nipônica de Plantação do Brasil (responsável pelos interesses da C.ia de Exploração da América do Sul no Brasil), que rapidamente assumiu o contrato de doação das terras.

A “sede” da Colônia Acará foi construída em Tomé-Açu. A primeira remessa de imigrantes para a nova colônia ocorreu em setembro de 1929, com a chegada de 43 famílias e 9 imigrantes solteiros, perfazendo um total de 189 imigrantes.

O abandono recorrente do serviço agrícola.

O principal produto cultivado pela C.ia de Exploração da América do Sul era o cacau. Como, porém, fossem necessários pelo menos quatro anos até que as primeiras sementes pudessem ser colhidas, os imigrantes recém-chegados dedicavam-se ao cultivo de hortaliças que eram comercializadas na cidade de Belém a fim de garantir sua subsistência. Em 1931, foi fundada a Cooperativa dos Horticultores de Acará, que permitia aos agricultores comercializarem os seus produtos de forma conjunta. Contudo, das 202 famílias que se instalaram na região num período de três anos, 61 famílias abandonaram o núcleo diante das dificuldades que lhes foram impostas.

Por desconhecerem os métodos e técnicas necessários à prática da agricultura na zona equatorial, também a tão esperada safra de cacau malogrou; o mesmo fim tiveram os empreendimentos mineradores na região, levando a C.ia de Exploração da América do Sul a um beco sem saída. Em abril de 1935, todas as atividades iniciadas pela companhia haviam sido canceladas ou, pelo menos, drasticamente reduzidas, até que a companhia desligou-se totalmente do seu projeto original e seu presidente, Hachirō Fukuhara, retornou ao Japão. Com isso, a administração da colônia ficou a cargo dos próprios imigrantes; a Cooperativa dos Horticultores de Acará, que foi reestruturada e foi rebatizada Cooperativa Agrícola de Acará, tornou-se o centro nervoso da colônia. Em 1936, com a ocorrência de um surto de malária na região, o número de imigrantes que abandonavam suas terras aumentou, permanecendo na colônia somente 98 famílias (483 pessoas) dentre as 374 (2.104 pessoas) que ingressaram na região entre os anos de 1935 e 1942.

A Colônia Acará durante os anos de guerra.

Quando, em 1942, o Brasil cortou inteiramente as relações diplomáticas que mantinha com o Japão, os bens da C.ia Nipônica e da Cooperativa Agrícola foram confiscados e seu controle foi transferido para o governo estadual. A Colônia Acará tornou-se um local de confinamento para os imigrantes dos países do Eixo, sendo enviados para lá alemães e japoneses de toda a área circunjacente ao curso superior do rio Amazonas. Os japoneses confinados na Colônia Acará eram usados principalmente na construção de estradas.

Os primeiros magnatas da pimenta.

Mesmo com o fim da guerra, a Colônia Acará continuou sob administração do governo do estado. Fundada por jovens que viviam na colônia, a Associação dos Agricultores de Acará passou, então, a agir à revelia do governo estadual, tendo conquistado, em favor da Cooperativa Agrícola de Acará, o direito de praticar o comércio livremente em 1946. Em setembro de 1949, a Colônia Acará foi rebatizada Colônia Tomé-Açu.

Seguindo as orientações dadas pela cooperativa, a pimenta, que fora introduzida na região ainda no pré-guerra, pela C.ia de Exploração da América do Sul (importada do Cingapura), começou a ser cultivada com o uso de adubos químicos e fertilizantes disponíveis no mercado, difundindo-se rapidamente entre os agricultores a partir da década de 50. Com a independência da Indonésia, boa parte das plantações de pimenta-negra foram transformadas em campos de arroz para atender à demanda da população local, provocando um aumento no preço da pimenta nos mercados mundiais a partir de 1952; a alta nos preços atingiu o ápice entre os anos de 1953 e 1954. A pimenta-negra, também conhecida como diamante negro, ensejou assim o surgimento de magnatas da pimenta. Embora o preço da pimenta viesse a sofrer uma queda significativa em 1957, 7% da pimenta produzida no mundo continuou sendo cultivada por cerca de 200 famílias na Amazônia.