Capítulo 5 - A ascensão do nacionalismo e os movimentos anti-japoneses. (1)

A política de quotas e a origem dos movimentos anti-japoneses.

As teses anti-japonesas em alta.

Em outubro de 1930, Getúlio Vargas implantou o Estado Novo após um golpe de estado. O número de desempregados crescia em decorrência da crise da bolsa de valores e, com isso, crescia também o nacionalismo. Entre os brasileiros, muitos suportavam ou simpatizavam com idéias que pregavam o ódio ao estrangeiro. Naquele mesmo ano, foi criado um sistema de quotas para entrada de estrangeiros no país. Como, porém, os japoneses conseguissem escapar ao sistema de quotas e o número de japoneses entrados permanecesse alto, sua presença foi se tornando bastante conspícua.

A isso, acresce-se o fato de que, depois do incidente com a Manchúria, em 1931, mesmo no Brasil já surgia um sentimento de oposição contra os japoneses. O estado de alerta aumentou quando, em 8 de abril de 1933, um telegrama enviado de Tōkyō levou um jornal carioca a divulgar a informação de que os imigrantes enviados ao Brasil seriam transformados em novos imigrantes para a Manchúria. Aqueles que eram simpáticos ao Japão sentiram-se desconfortáveis, pois acreditavam que o Brasil estava sendo usado como um anteparo para a Manchúria, enquanto que aqueles que eram contrários ao Japão enxergavam o envio de um número tão elevado de imigrantes como parte de um plano para a invasão do país.

Dessa maneira, as teses anti-japonesas começaram a circular cada vez mais ativamente entre os brasileiros.

O surgimento da política de quotas.

Quando as atividades para a elaboração de uma nova constituição tiveram início, em 30 de novembro de 1933, na Assembléia Constituinte, foram apresentadas quatro emendas que tinham por objetivo restringir a entrada de imigrantes de acordo com a etnia a que eles pertencessem, dando ênfase ao imigrante japonês. As razões apresentadas para sustentar essas emendas eram, basicamente, o fato de que o imigrante japonês era pouco assimilável, o perigo de o Brasil transformar-se numa nova Manchúria e, além de tudo, os brasileiros tinham pouco interesse em acrescentar elementos asiáticos ou africanos à sua composição nacional. Embora houvesse muitas contestações a essas emendas, em 24 de maio de 1924, foi aprovada pela mesma Assembléia a cláusula proposta pelo prof. Miguel de Oliveira Couto (notadamente anti-japonês), que previa a restrição do número de imigrantes entrados a 2% do total de imigrantes de mesma nacionalidade que tivessem se estabelecido no Brasil entre 1884 até 1933. Como até então 142.457 japoneses houvessem entrado nos portos brasileiros, o número de imigrantes permitidos pela lei foi fixado em 2.849 imigrantes (ou seja, 2% de 142.457).

Ocorre, porém, que a aplicação da nova lei não foi imediata e, além disso, os menores de 14 anos não eram incluídos entre os 2.849 imigrantes permitidos por lei, de modo que até 1937 cerca de cinco mil japoneses entraram no país.

A visita da Missão Econômica ao Brasil.

Em resposta à criação da lei de quotas, surgia no Japão a consciência de que não havia, entre os dois países, qualquer forma de intercâmbio, fosse ele acadêmico, artístico, religioso, econômico ou esportivo. A fim de melhorar as relações diplomáticas e comerciais entre os dois países, foi enviada, entre os meses de maio de junho de 1935, pela Câmara de Comércio e Indústria do Japão, a Missão Econômica ao Brasil (presidida pelo diretor-chefe da Federação das Cooperativas de Emigração Ultramarina, Hachisaburō Hirao).

Com relação à importação de algodão, o representante do Comitê de Promoção às Indústrias Têxteis do Japão já havia visitado o Brasil em 1934 e dado início às pesquisas no local; porém, foi somente com a chegada da Missão Econômica que um canal de negociação pela compra e pela importação do algodão cultivado no Brasil pelos imigrantes foi inaugurado. Em conseqüência disso, as importações de algodão brasileiro realizadas pelo Japão sofreram um aumento súbito a partir de 1936. Nesse ponto, pode-se dizer que a Missão Econômica tenha sido bem-sucedida.

O fim das concessões na Amazônia.

A construção de laços econômicos desta natureza, no entanto, não se vinculava a qualquer tentativa de conter o avanço dos movimentos anti-japoneses. O artigo n.º 130 da nova constituição estabelecia que qualquer concessão de terras que envolvesse a doação de mais de 1 hectare dependia da aprovação das instâncias superiores do Congresso Nacional. Em março de 1936, foi encaminhado ao Senado Federal o pedido de concessão de terras do Centro de Pesquisas Agronômicas da Amazônia (Amazonas). Isso foi feito no mesmo momento em que uma organização anti-japonesa, a Casa Torres, deu início a um movimento de contestação das concessões, seguido da publicação, nos jornais brasileiros, de um suposto plano de construção de uma base naval japonesa na Amazônia, em virtude da proximidade com o Canal do Panamá.

Muito se discutiu a respeito da doação das terras, havendo grupos favoráveis e contrários à concessão, até que, em 24 de agosto, o Senado Federal chegou a um veredito, aprovado por todos os membros da assembléia, e a concessão foi negada, alegando-se motivos de segurança nacional.

A proibição do ensino do idioma japonês.

Proibição do ensino de línguas estrangeiras a crianças menores de 10 anos.

O novo pacote de leis sobre a educação, promulgado em dezembro de 1920, proibia o ensino de línguas estrangeiras a crianças menores de 10 anos nas escolas particulares (nas escolas públicas, não se ensinavam línguas estrangeiras). Contudo, as aulas propriamente ditas ainda continuaram sendo dadas em japonês nas escolas japonesas do interior paulista.

Em dezembro de 1928, como muitas escolas que não contavam com professores brasileiros continuassem a ministrar as aulas em japonês nos arredores da estrada de ferro Noroeste, a Secretaria da Educação do estado de São Paulo ordenou o fechamento de algumas dezenas dessas escolas. Outras, que funcionavam como escolas brasileiras regulares, continuaram oferecendo aulas em japonês à parte, em caráter complementar.

O fechamento das escolas de língua japonesa.

Em setembro de 1936, foi divulgado no jornal Folha da Manhã um balanço que mostrava os baixos níveis de conhecimento da língua portuguesa entre os estudantes japoneses do interior de São Paulo, logo após a inspeção feita pelo secretário de educação do estado em Bastos e outras regiões. Outros jornais criticaram o caráter não-assimilável dos japoneses citando a mesma reportagem. Diante disso, a Associação para Difusão do Ensino entre os Japoneses do Brasil adotou prontamente uma posição que favorecia um ensino voltado para a formação de cidadãos brasileiros, ordenando a suspensão das aulas em japonês.

Mesmo então, as políticas de caráter nacionalista continuaram a multiplicar-se, desembocando na proibição, emitida em 4 de maio de 1938, do uso de línguas estrangeiras dentro das escolas entre crianças menores de 14 anos. Em seguida, foi promulgado o decreto-lei n.º 406, que dispõe sobre a entrada de estrangeiros no território nacional, limitando o exercício do magistério somente a indivíduos nascidos no Brasil (o decreto entrou em vigor a partir de 21 de dezembro do mesmo ano). Por conta disso, todas as escolas primárias japonesas situadas na zona rural (isto é, situadas em áreas não pertencentes às capitais federal e estaduais ou às cidades portuárias onde houvesse entrada de estrangeiros) tiveram de ser fechadas.

Com o fechamento das escolas, o ensino da língua japonesa passou a ser feito nas residências de particulares ou por professores itinerantes. Os professores itinerantes, no entanto, ao reunir quatro ou cinco crianças para as aulas, eram eventualmente denunciados às autoridades brasileiras por estarem montando escolas japonesas ilegais e acabavam sendo desmascarados.

Houve também aqueles que, tendo desistido da educação no Brasil, enviavam os filhos de volta ao Japão a fim de garantir-lhes a instrução.

O crescimento dos nisseis.

Em 1935, aproximadamente, existiam entre 150 e 200 estudantes nisseis com curso ginasial completo, e cerca de 10 estudantes matriculados no ensino superior. Em 21 de outubro de 1934, foi criada a Liga dos Estudantes Japoneses de São Paulo, uma entidade de caráter social voltada para os estudantes nikkeis.

Havia diferenças quanto ao modo de pensar dos nisseis em relação ao grau de proximidade que eles possuíam com a sociedade brasileira. Entre os nisseis crescidos no interior, havia aqueles que, embora sentissem afeição pelo Brasil, falavam o japonês fluentemente e herdavam de seus pais estrangeiros o sentimento de patriotismo pelo Japão. Entre os que eram criados nas cidades e tinham um contato mais intenso com a sociedade formada pelos brasileiros, havia aqueles que respeitavam o Japão somente na medida em que este fosse a terra natal dos seus pais, acreditando serem eles próprios brasileiros e que, como tais, amavam o Brasil.

Entre aqueles que possuíam dupla nacionalidade, houve casos de pessoas que retornaram ao Japão e se alistaram no serviço militar, enquanto outros alistaram-se no exército brasileiro após a entrada do país na guerra (ocorrida em 22 de agosto de 1942, com a declaração de guerra aos países do Eixo) e foram enviados para a frente de combate na Itália.