Artigos «A Hospedaria dos Emigrantes em Kōbe (Centro de Emigração de Kōbe).»

A Hospedaria dos Emigrantes em Kōbe (Centro de Emigração de Kōbe).

“Dia 8 de março de 1930. Chovia sobre o porto de Kōbe — uma chuva primaveril, que levantava uma fumaça fina (...). A ladeira de terra vermelha que havia entre a estação de Sannomiya e Yamanote estava coberta de lama (...). Um prédio grande e amarelo, desprovido de adornos, assomava sobre o ângulo formado pela trilha e uma colina (...). Aquela era a Hospedaria Nacional dos Emigrantes Ultramarinos de Kōbe” (Tatsuzō Ishikawa, Sōbō, Kaizōsha, 1935).

Como que prenunciando o dia-a-dia na Hospedaria dos Emigrantes e a vida que os emigrados levariam no Brasil, país de seus sonhos, assim começa o romance Sōbō, de Tatsuzō Ishikawa, vencedor do primeiro Prêmio Akutagawa.

Como conseqüência da Lei de Incentivo à Emigração, fora construída sobre uma colina, em março de 1928, a Hospedaria Nacional dos Emigrantes Ultramarinos de Kōbe (atualmente rua Yamamoto, 3-19-8, bairro de Chūō, cidade de Kōbe), exatos vinte anos depois da partida do Kasato-maru.

Por conta da construção da nova hospedaria, as pousadas que ofereciam guarida aos imigrantes nos arredores da doca Meriken ficaram em grande alvoroço, registrando-se muitas demissões de funcionários em conseqüência do baixo número de fregueses (Diário “Kōbe Yūshin Nippō”, número de 5 de março de 1928). Conta-se que os imigrantes que estavam abrigados nas pousadas foram levados de carro até a nova hospedaria graças aos esforços das companhias de emigração no dia 10 de março.

A primeira leva de emigrantes a serem abrigados na hospedaria contava 581 pessoas.

Nos dez dias em que os emigrantes ficavam confinados à hospedaria, havia palestras e seções de vacinação que ocupavam o dia todo. A estadia, porém, era gratuita. A rotina da hospedaria aparece descrita numa matéria do Diário “Kōbe Yūshin Nippō”, que foi publicada entre os dias 13 e 19 de março de 1928.

Antes da partida do Hawaii-maru, no dia 17 de março, os emigrantes deram três “vivas” e desceram em fila a “ladeira dos emigrantes” (como ficou conhecida) até o cais do porto.

No dia da partida, o mesmo diário publicou uma matéria com os dizeres: “trajando curiosas roupas ocidentais, os emigrantes formaram uma longa fila para em seguida deixarem, com grande azáfama, o porto de Kōbe, enquanto anseavam pelo perfume dos cafezais brasileiros”.

A Hospedaria dos Emigrantes foi rebatizada como “Centro de Habilitação para os Emigrantes Ultramarinos de Kōbe” em 1932. Durante a guerra, o prédio foi transformado no Centro de Treinamento Civil da Grande Ásia Oriental, sendo utilizado para a instrução de trabalhadores civis a serem enviados para as áreas recém-ocupadas pelo exército japonês. Em 1952, a Hospedaria foi reaberta com o nome “Central de Serviços de Emigração de Kōbe”, acompanhando a retomada da remessa de emigrantes para o exterior. A partir de 1956, já se verificava um aumento substancial no número de emigrantes que embarcava no porto de Yokohama, última parada dos navios no Japão.

Em 1964, o prédio novamente rebatizado, desta feita como “Centro de Emigração de Kōbe”, mas, com a queda de emigrantes servindo-se daquele porto, a antiga hospedaria encerrou suas atividades em 31 de maio de 1971, depois de quase 40 anos de funcionamento (incluindo-se o período em que a emigração esteve interrompida).

A situação de caos que se seguiu ao terremoto que atingiu as cidades de Ōsaka e Kōbe em 1995 teve grande impacto sobre a vida dos trabalhadores nikkeis que habitavam nas proximidades. Conta-se, porém, que muitos nipo-brasileiros haviam redescoberto as suas raízes no prédio cercado de ruínas da antiga hospedaria, incólume após o tremor.

A história dos imigrantes iniciou-se aqui.

Em frente à entrada da antiga hospedaria, foi construído um monumento com a inscrição: “aqui começa a emigração japonesa para o Brasil”.

Não teria sido o reconhecimento prestado aos emigrantes para o ultramar em Kōbe, após o terremoto, mais uma dessas reviravoltas que ocorrem na história?

Outro monumento, que representa os navios que levavam os emigrantes de Kōbe para o ultramar, foi construído no Meriken Park, e a “ladeira dos emigrantes” também passou por uma “reforma”.

Em 2007, foi aprovada a restauração e preservação do prédio da antiga hospedaria, questão que há muito vinha sendo discutida pelos japoneses.

Está prevista para os últimos dias de maio de 2009 a inauguração do “Kaigai Nikkeijin kaikan” (nome provisório), órgão que deverá atuar como museu da imigração/emigração, órgão de apoio aos estrangeiros residentes no país e de intercâmbio artístico.

Depois de remeter tantos emigrantes para o ultramar, a Hospedaria dos Emigrantes resistiu aos tremores de terra que sacudiram Kōbe e Ōsaka em 1997.

Como se fosse uma testemunha viva não somente da história da emigração, mas também da história contemporânea de Kōbe, a antiga hospedaria parece zelar, ainda hoje, pelo porto e pela cidade que o cerca.

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  • Artigos de jornais / revistas

    Dia-a-dia na Hospedaria dos Imigrantes

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  • Imagem «Tatsuzō Ishikawa a bordo do La Plata-maru (fotografia tirada em 29 de abril de 1930)»

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