Artigos «O Kasato-maru.»

O Kasato-maru.

O nome Kasato-maru não é somente o nome próprio de uma embarcação. Para os japoneses que emigraram para o Brasil e seus descendentes, “Kasato-maru” é também um símbolo. A trajetória percorrida pelos japoneses e seus descendentes no Brasil tem seu ponto de partida na viagem do Kasato-maru (Kasato-maru — sessenta anos mais tarde [Kasato-maru yori 60-nen], São Paulo, Federação das Associações de Províncias do Japão no Brasil, 1968, p. 13).

Na tarde de 28 de abril de 1908, o sol se recolhia serenamente no porto da cidade de Kōbe. Debaixo dos fogos de artifício que anunciavam sua partida, o vapor Kasato-maru (pertencente à C.ia de Navegação a Vapor Oriental com capacidade de 6.167 toneladas) zarpava em direção ao porto de Santos, levando os primeiros 781 emigrantes japoneses contratados àquele país.

Depois de passados mais de cinqüenta dias a bordo, regados à náusea provocada pelo balouçar da embarcação e ao calor, entretidos e alimentados, os imigrantes desembarcaram no cais 14 de Santos na manhã de 18 de junho, tendo percorrido quase 12 mil milhas náuticas entre o início e o fim da viagem.

Esse dia é comemorado no Brasil como o Dia da Imigração Japonesa; no Japão, ele é o Dia da Emigração Ultramarina.

“Navio de imigrantes que chega ao porto olhando para o alto, onde as quedas-d’água já não correm mais”. Este teria sido o primeiro poema do tipo haiku escrito no Brasil. O autor destes versos é o então supervisor de imigração, Shūhei Uetsuka (pseudônimo Hyōkotsu), que viajou a bordo do Kasato-maru junto com os primeiros imigrantes.

Ao lado de Ryō Mizuno, presidente da C.ia Imperial de Colonização (responsável pelo recrutamento dos imigrantes), Shūhei Uetsuka é lembrado como o “pai da imigração”.

Com relação à viagem do Kasato-maru, um dos relatos mais importantes a seu respeito é o diário de bordo deixado por Ryō Mizuno. Outros dados factuais importantes podem ser encontrados na coleção do Observatório Meteorológico-Marítimo de Kōbe (The Kobe Collection).

Existem diversas versões sobre a origem do Kasato-maru, que pode ser resumida da seguinte maneira: o vapor misto Potosí, construído na Inglaterra, foi vendido à frota militar russa em junho de 1900, sendo rebatizado como “Kazan”.

Depois de ser abatido pela frota naval japonesa no porto de Ryojun, durante a Guerra Russo-Japonesa, o “Kazan” foi confiscado pela Marinha Japonesa e sua posse foi confiada ao distrito naval de Kure, sendo rebatizado como “Kasato-maru”.

Em julho de 1906, o Kasato-maru foi alugado da Marinha pela C.ia de Emigração Oriental, sendo utilizado na cobertura das rotas do Extremo Oriente e da costa oeste das Américas. O vapor entrou para a História ao se tornar, em 1908, o primeiro navio usado no transporte de emigrantes japoneses para o Brasil.

Com o fim da participação de Mizuno na empreitada imigratória, a imagem do Kasato-maru nunca mais foi vista em Santos, embora haja registros de que o vapor tenha deixado 10 imigrantes espontâneos em sua passagem pelo Rio de Janeiro no ano de 1917.

Quando, no entanto, o Senado americano aprovou a lei que vetava a entrada de imigrantes japoneses, em 1924, o Kasato-maru deixou o porto de Kōbe no dia 14 de junho, levando a bordo os últimos 320 emigrantes japoneses para o Havaí.

Além de ter transportado os primeiros imigrantes japoneses para o Brasil e os últimos imigrantes japoneses para o Havaí, o Kasato-maru também foi navio de passageiros, navio-enfermaria e navio-fábrica flutuante de sardinha, salmão e caranguejo. Como que por ironia do destino, o navio foi bombardeado pelo exército soviético em 9 de agosto de 1945, na península do Kamtchatka, logo após a entrada da União Soviética na Segunda Guerra.

Às 5:55 da tarde (mesma hora da partida do Kasato-maru, cem anos antes) do dia 28 de abril de 2008, todos os navios que estavam ancorados no porto de Kōbe fizeram soar os seus apitos, simultaneamente.

Enquanto isso, um navio deixava o porto transportando para o Brasil a Tocha da Amizade, acendida na laje da antiga Hospedaria dos Imigrantes de Kōbe.

Passados cem anos desde aquela viagem do Kasato-maru, cogita-se içar do fundo do mar de Okhotsk as âncoras do Kasato-maru, devendo ser elas preservadas conjuntamente por Kōbe e pelo Brasil.

O Kasato-maru é, sem dúvida, símbolo dos cem anos da presença japonesa no Brasil. Mas é também o símbolo de uma nova era de intercâmbio entre as duas nações.